O milagre do nordeste

 

   Ante a desolação da terra comburida,
   O homem, depondo a enxada, acurvado de mágoa,
   Pôs o joelho no chão e mal pôde dizer:

   – "Deus! Com o sol que me dás, tu me tiras a vida....
   Manda-me por piedade um pouco d´água
   Para o meu pobre gado não morrer!."

   E apontava com o braço escarnado a campina
   Onde os trapos daquela imensa ruína
   Mugiam com vergonha de viver

   
    – "Deus! Meu cavalo ontem morreu de fome e sede
   Enterrei-o envolvido em minha rede:
   Era o que tinha de melhor para lhe dar."

   E, sem poder dizer tudo o mais que sentia,
   Os braços alongando à tarde que morria,
   O homem, junto à enxada, atirou-se a chorar...

   E, sobre ele, choveu a noite toda, sem parar.”

 

                                                      Virgilio Pinto de Aragão
                                                     (Professor Sinhorzinho)